Para CNDL, é 'praticamente
impossível' informar valor preciso de tributos. ACSP sugere modelo e diz que 6
meses são suficientes para adaptação.
A nova nota
fiscal, com o detalhamento do valor de impostos, conforme projeto de lei
aprovado na Câmara, garante maior transparência, mas ainda não há consenso
sobre a viabilidade do projeto, devido, principalmente, à complexidade do
sistema tributário brasileiro, e também aos custos que a mudança pode
significar para o empresário, segundo representantes do varejo e especialistas
consultados pelo G1.
Na noite de
terça-feira (13), a Câmara dos Deputados aprovou projeto de lei que obriga que
as notas fiscais informem o valor de impostos embutidos nos produtos ou
serviços adquiridos pelo consumidor. De iniciativa popular e apresentada
inicialmente no Senado, o projeto precisa agora ser sancionado pela presidente
Dilma Rousseff.
“A ideia é
excepcional. Isso geraria transparência e somos plenamente favoráveis ao
intuito da lei. (...) O problema todo está na complexidade do sistema
tributário brasileiro, que foi projetado para esconder os tributos e permitir,
inclusive, que haja bitributação”, diz Roque Pellizzaro Júnior, presidente da
Confederação Nacional de Dirigentes Lojistas (CNDL). “Vejo dificuldades na
implantação.”
Em entrevista nesta
quarta-feira (14), o ministro da Fazenda, Guido Mantega, disse que é favorável
ao projeto de lei, mas prevê "dificuldades operacionais" para
implantar as mudanças.
O presidente da
CNDL destaca que o regime tributário varia muito, dependendo do tamanho da
empresa, do tipo de produto. “Se sou microempresa, tenho um tipo de tributação;
pelo lucro real, outro tipo de tributação; pelo presumível é outro ainda. (...)
Cide vai discriminar quem é posto de combustível; PIS/Cofins, quem está no
Simples, não vai aparecer, mas quando compro um produto, ele tem PIS/Cofins
embutido”, explica. “Posso afirmar que é praticamente impossível que coloque um
número preciso do tributo. Pode ser que se consiga um valor aproximado.”
A
Associação Comercial de São Paulo (ACSP) faz menos ressalvas em relação ao
projeto de lei. A entidade acredita, por exemplo, que o prazo de seis meses
para que os estabelecimentos se adaptem, após sanção da Presidência, seria mais
que suficiente. A ACSP já formulou, inclusive, um modelo sugerido de nota
fiscal com o campo dos impostos discriminados (veja acima).
Rogério Amato,
presidente da ACSP, diz que a aprovação do projeto de lei veio depois de uma
espera de 2.365 dias e afirma que saber quanto está sendo pago de imposto é um
direito de todo cidadão, previsto na Constituição. “Mas nosso manicômio
tributário é tão absurdo que ninguém sabe o que está pagando”, critica.
Ele destaca que a
entidade não é contra o pagamento de impostos. “Somos a favor, mas nós queremos
saber o quanto estamos pagando e para onde está indo isso”, diz.
Custos da mudança
Outro ponto de
questionamento é em relação aos custos desta mudança. “Em relação ao varejo, a
imensa maioria é de PMEs [pequenas e médias empresas] e isso vai significar um
custo a mais. O prazo de seis meses é muito curto, não vão conseguir se
adaptar”, argumenta Pellizzaro Júnior, da CNDL.
Claudio Felisoni de
Angelo, presidente do conselho do Programa de Administração de Varejo
(Provar/Ibevar) da Fundação Instituto de Administração (FIA), também avalia que
a implementação do projeto pode resultar em custos para as empresas. “Haverá
mudanças operacionais que vão impactar no curto prazo, mas acho que os
benefícios superam em larga monta esses custos”, opina.
Para a ACSP,
entretanto, a mudança não acarretará em aumento de gastos para as empresas.
“Posso afirmar categoricamente que não vai haver nenhum custo adicional. Já
existe um software, desenvolvido pelo IBPT [Instituto Brasileiro de
Planejamento Tributário], que está lendo os nove impostos”, diz Amato. “Se
tivéssemos que pagar alguma coisa, ainda assim, valeria muito a pena”.
Nove impostos
Gilberto Luiz do
Amaral, presidente do conselho superior e coordenador de estudos do IBPT,
informa que, desde outubro do ano passado, a entidade mantém no ar o site “Lupa
no Imposto”, em que qualquer pessoa pode consultar a carga tributária incidente
nos produtos. Ele afirma, entretanto, que será preciso fazer adaptações,
dependendo do que for ou não sancionado.
“Criamos o ‘Lupa no
Imposto’ já prevendo a aprovação da lei. Agora vamos nos adequar de acordo com
os critérios estabelecidos pela lei. Trata-se de um software que está
apresentado hoje num site e que será disponibilizado para que as empresas se
conectem a ele via web service e que possam ter essas questões (nota fiscal e
painéis informativos), sem custo nenhum. Este é um serviço que será
disponibilizado pelo IBPT, em conjunto com a Associação Comercial”, explica.
O sistema já está
lendo os impostos exigidos no projeto de lei, ou seja, ICMS, ISS, IPI, IOF, IR,
CSLL, PIS/Pasep, Cofins e Cide. Vale lembrar que os impostos variam dependendo
do tipo de produto ou serviço, do Estado da federação, se é indústria ou
comércio, se está comercializando para a cadeia produtiva ou varejo, etc.
“Vivemos num país que tem o sistema tributário mais complexo do mundo, não é
simples”, admite Amaral.
Para ele, o projeto
não implica em aumento da burocracia. “O empresário precisa deixar de ser
cabeça dura, porque ali vai estar demonstrado que grande parte do preço que ele
cobra do consumidor é de imposto”, afirma.
Vantagens para a população
Felisoni argumenta
que o projeto de lei é uma “questão política de conscientização da população”.
“O peso do governo é absurdo. (...) O governo é um prestador de serviços com
base naquele valor que está sendo recolhido em determinado produto que eu
compro”, diz.
“As pessoas
precisam tomar consciência e, a partir desta clarificação, perceber quem é o
grande ‘sócio’. E começar a cobrar, de forma mais efetiva, o resultado deste
valor que é pago. É muito fácil dizer ‘o preço é tanto’, mas têm 40%, 50% de
imposto embutido. E esse dinheiro todo financia uma máquina que, nós sabemos, é
muito ineficiente”, acrescenta.
A Federação do
Comércio de Bens, Serviços e Turismo do Estado de São Paulo (FecomercioSP)
também vê vantagens na aprovação do projeto de lei, mas faz ressalvas.
“Realmente estava na hora de a sociedade como um todo conhecer efetivamente o
quanto paga-se de imposto no Brasil”, diz José Maria Chapina Alcazar,
presidente do Conselho de Assuntos Tributários da entidade.
O receio, no
entanto, é que a regulamentação da lei transfira o ônus da alteração para o
empreendedor brasileiro. “Quem paga por toda alteração é sempre o
contribuinte”, critica.
Ele lembra que a
mudança exigiria que as empresas reestruturassem seus sistemas de controle. “Os
empresários precisariam ser incentivados com recursos de crédito tributário,
porque senão vai acabar pagando essa com certeza e a formalidade vai ser
prejudicada mais uma vez no nosso país. Isso vai aumentando o Custo Brasil”,
diz. Para Alcazar o mais importante seria reformular o sistema tributário do
país.
Cidadania fiscal
Do ponto de vista
do consumidor, a aprovação foi recebida com entusiasmo. Para Paulo Arthur Góes,
diretor-executivo da Fundação Procon-SP, a transparência é importante. “Isso
aqui é nada mais que cumprir aquilo que está na Constituição, a educação do
cidadão para as questões tributárias. Estamos falando de cidadania fiscal”,
argumenta.
Conhecer o que está
sendo pago é dar ao cidadão a chance de ele se “empoderar”, defende. “Você só é
capaz de cobrar aquilo que tem conhecimento. A partir do momento que você
consegue entender, discernir, pode exigir a contrapartida”, diz.
“Assim como no caso
da nota paulista, tem tudo para tornar mais consciente o consumidor daquilo que
ele paga, o valor efetivo da mercadoria, inclusive para poder participar cada
vez mais do processo da democracia. Ele é protagonista deste processo, e não um
mero telespectador”, acrescenta Góes.
Mas ele também
reconhece que "a viabilização prática deste projeto é muito difícil, dada
a complexidade do nosso sistema tributário atual”.
* G1
Extraído: CRC SC
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